" Nessa última segunda-feira, fui impedido de entrar no campus da UFRJ - onde estou fazendo um curso de pós-doutorado - pelos mesmos porteiros que estão, habitualmente, em seus postos para facilitar a entrada das pessoas. Por causa da greve, explicaram. Disseram-me que isso (ser "barrado") não ocorria, no país, desde a época do regime militar.
Estou seguindo um curso, no setor de História da UFRJ, exatamente com o objetivo de conseguir entender as agudas contradições do Brasil. "Somos um país tolerante, cordial" - proclamaram Gilberto Freyre e Sergio Buarque - mas o que se vê, no dia-a-dia, são os sinais de violência e a prática da intolerância.
Na discussão da questão da universidade brasileira, é absurda a radicalização das partes - a tal ponto, que o ministro Paulo Renato, preocupado com a imagem de presidenciável, parece ter desistido de arbitrá-la.
O que dizem os críticos da universidade pública? Que representa um peso para a nação: é ineficiente, injusta, perdulária e corporativista. Ineficiente porque - demasiadamente conceitual e teórica - não prepara nem para a vida nem para o trabalho. Injusta por prestar seus serviços a quem menos precisa deles: as classes mais abastadas. Perdulária, porque apresenta baixíssima relação alunos x professores e alunos x funcionários. Na ponta do lápis, custa de 3 a 8 vezes mais à sociedade do que um aluno formado na escola privada. E corporativista - sem nenhum privilégio - como é corporativista toda a sociedade brasileira, com a agravante de que a versão acadêmica inclui o patrulhamento ideológico: uma só linha de pensamento costuma ser aceita, especialmente nas escolas federais.
Os defensores têm argumentos consideráveis. Não admitem as medições quantitativas de eficiência, uma vez que, atualmente, só as universidades públicas se dedicam ao importante trabalho de pesquisa, praticamente inexistente na rede particular. (Devo testemunhar que, no meu recente convívio com nossas universidades públicas, conheci profissionais de rara competência, à altura dos melhores do 1º Mundo). Por outro lado, seus números - que são de domínio público, diferentemente dos das particulares - incluem a onerosa manutenção de hospitais e outras instituições de serviços - além de substancial passivo de pensões e aposentadorias, o que não ocorre com as de direito privado. A admissão de alunos de maior poder aquisitivo reflete a qualidade do processo de seleção - e, mesmo assim, são as públicas que oferecem maior número de bolsas aos jovens de famílias carentes.
Ao suposto corporativismo ideológico, contrapõem-se críticas ao mercantilismo de muitas escolas particulares, excessivamente presas a orçamentos que não admitem prejuízo.
Enquanto isso, a educação superior continua apresentando números comprometedores, que colocam o país abaixo do Chile e da Argentina, no mesmo nível do Paraguai e de Zâmbia. E a participação do ensino privado cresce cada vez mais.
Será difícil resolver o problema no âmbito do MEC. Como percebeu o ministro, os setores-chave da instituição estão nas mãos de profissionais ou simpatizantes das universidades públicas, que são - inclusive - as que "julgam" o ensino particular, através dos provões e das comissões de avaliação. Diante do premente desafio de modernização do Estado, é, hoje, definitivamente questionável se a educação deve continuar centralizada em Brasilia. Nos EUA, por exemplo, o sistema é administrado pelos Estados.
Mas pior do que tudo será radicalizar. Nas críticas e suas defesas, há elementos de verdade e de distorção que não são difíceis de identificar e distinguir. Há, também, escolas públicas e privadas extremamente respeitáveis e as há absolutamente desqualificadas - o que não deveria ocorrer.
A sociedade precisa de suas universidades públicas, como as universidades - e o pessoal que nelas trabalha, de fato - precisam de reconhecimento pela contribuição que dão - e pela que podem dar ainda mais, se aceitarem as vassouradas e espanadas de que carecem, nos seus recantos menos acessíveis.
E não pode ser deixado para depois. Ou as universidades públicas poderão seguir o mesmo caminho dos nossos portos marítimos, tornando-se caras e inúteis ruínas, vítimas da intolerância e da falta de visão. "
J. Roberto Whitaker Penteado
Nenhum comentário:
Postar um comentário